terça-feira, 2 de julho de 2013

Não quero que ninguém saiba


Pelo que entendo o normal ou pelo menos o mais comum é que ao receberem o diagnóstico de câncer as pessoas se fechem e não contem a ninguém, só aos mais íntimos e de uma forma geral nem tocam no assunto quando se encontram. Falar a palavra câncer então parece uma maldição. Comigo foi bem diferente e posso dizer que isto foi um grande diferencial, que me fez muito bem.

Em Março de 2011 fomos ao aniversário da filha de um amigo, Valter Luis, que fazia 15 anos. Ele é engenheiro, assim como vários dos meus amigos e por isto mais fechado e com um pouco de dificuldade em mostrar sentimentos (por favor, não é uma crítica, apenas uma constatação), mas quando veio falar comigo a primeira coisa que falou foi que gostava da maneira como eu dividia com as pessoas o que estava acontecendo comigo e na opinião dele é como se eu deixasse um pouquinho do problema com cada um e assim ficava mais fácil de superar. Acho que isto faz sentido e tenho certeza que o apoio que recebi e recebo é fundamental para a minha saúde. Depois acabei lendo um livro do Max Gehringer, Clássicos do Mundo Corporativo e aprendi que a palavra “problema” é de origem grega e significa exatamente isto: “passar adiante”. Sem saber estava levando meu “problema” ao pé da letra.
Assim que fiz o primeiro exame e me disseram que eu tinha 95% de chance de estar com câncer pedi que meus amigos rezassem por mim, torcessem para que os 5% se confirmasse. Quando falo em amigos estou falando de todas as pessoas que eu acho que tem um carinho grande por mim. Não estou falando apenas destes amigos que dizemos que temos poucos, que podem ser contados nos dedos das mãos, estou falando de todas as pessoas maravilhosas que nos circulam e que às vezes nem temos tempo de perceber o quanto gostam da gente.
Infelizmente o resultado deu positivo e eu continuei dividindo com todas as pessoas o que estava acontecendo comigo. Escrevia para todos contando cada passo, cada decisão importante que havia tomado cada medo e cada decisão que tomava.
Aprendemos que não devemos incomodar os outros, que as pessoas não querem saber de coisas chatas, que as pessoas já têm muita coisa para se preocupar e que por isto não devemos atrapalhá-las com os nossos problemas e principalmente que as pessoas se afastam de pessoas com problemas. Se isto for o correto eu fiz tudo errado, mas o que importa é que para mim deu resultado.
Eu pedi ajuda a todos, cada e-mail que eu recebia era uma injeção de ânimo que recebia. Isto me fez um bem incrível.
Pedi para que meus amigos, que foram os grandes responsáveis pela minha recuperação que escrevessem como receberam a notícia e como foi participar da minha recuperação. Não estou escrevendo os depoimentos para mostrar como as pessoas me veem como alguém fora do normal, pelo contrário, quero mostrar que não atrapalhamos os outros, que não vamos ser hostilizados ou que vão se encher de piedade se dividirmos nosso problema com as pessoas que nos querem bem. Preste atenção que é uma via de mão dupla, eles nos ajudam e nós os ajudamos também.
Desde que eu tive meu primeiro diagnóstico de câncer lembro que algumas pessoas famosas, que são muito populares, enfrentaram o mesmo problema; Ana Maria Braga, Hebe Camargo, Gianecchini e outros. Vocês podem imaginar como estas pessoas receberam orações e energia de todos que as admiram? Na minha cabeça é impossível não ter uma melhora, não ser contaminado por esta força do pensamento. Li uma entrevista com a Hebe, que já faleceu, infelizmente, que ela mencionava isto, é quase como uma obrigação você melhorar, a gente recebe tanta energia que a melhora é quase que inerente a nossa vontade é quase uma obrigação. Fica como um sentimento de não poder decepcionar tantas pessoas que estão orando por você, torcendo por você.

Aqui alguns dos depoimentos dos meus amigos que foram, com certeza, fundamentais para a minha recuperação.


Olha, sempre fico surpreendida e ao mesmo tempo feliz em saber que de alguma forma eu possa ter contribuído para a sua recuperação mesmo estando longe de você. (para mim longe é um lugar que existe). Me lembro que quando você me contou sobre o câncer, óbvio que como qualquer pessoa você estava arrasada e com o tempo começou realmente a dividir os passos do seu tratamento e com eles nos relatava um pouco do seu sofrimento e tristeza. Contudo você deve saber que a intensidade faz parte da forma como você leva a vida e com o câncer não foi diferente. Por essa sua característica imagino a sua dor, mas o que acho bom ressaltar é o poder das suas atitudes. Me marcou muito dois emails seus. Um foi que você estava muito triste porque seu cabelo estava caindo  aí eu te respondi que cabelo nascia de novo e que você poderia comprar uma peruca. Logo em seguida você me respondeu dizendo que já tinha uma peruca ultra moderna e que não deixava o Fernando te ver sem peruca. Achei o máximo, pois se está mal o que podemos fazer para melhorar?  Segundo momento foi o dia que você me disse que havia feito o tratamento com quimioterapia e depois foi fazer aula de hidro. Fiquei imaginando você nessa aula, falando como tinha sido o procedimento, as pessoas te dando forca e você desabafando e com isso tornando mais leve o seu tratamento.
 
Lêda, o que eu posso te dizer é que concordo com a frase que diz que tudo que não nos mata nos fortalece e é assim que eu tenho te lido esses últimos tempos. Muito mais forte e feliz.
 
Boa sorte,

Neli

Este é mais uma parte do meu livro "Um ponto fora da Curva", em breve trarei inteiro  com todos os depoimentos. 
Espero que tenha mostrado que por mais que procuremos sempre a felicidade as pessoas estão prontas para receber nossas fraquezas e que receber apoio dos outros nos torna mais forte. Passe adiante, deixe seus problemas com quem pode te ajudar.

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